Poema

Assim como quem precisa de piedade, de clemência, preciso te escrever um poema.

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Quero escrever um poema bem lindo, que toque o seu coração e que te faça fechar os olhinhos rasgados.

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Quero que ele te esquente como o sol no sereno, e que te faça rir um sorriso pequeno, sozinho, em qualquer lugar.

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Ele vai ser tão lindo que vais querer decorar cada signo, cada curva da minha letra, vai tatuar um verso no corpo, vai te fazer lembrar da tua flor.

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Você vai procurar um papel cheiroso, uma foto, ou talvez uma moldura, e não vai achar. Nada vai parecer ornar com ele.

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Te lembrará de um tempo que nunca existiu, nem nos teus sonhos, de uma felicidade tão plena que foge às tuas habilidades sequer cogitá-la, que existe maior que vc, que eu, que tudo junto...

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...vai soar como toalha de setin, como vela acesa, como reza pronta, como pão e fome, como água e sede... vai abrir seus olhos, então, quem sabe, você vai me ver.

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Com ele, por meio dele, eu vou te obrigar a pensar em mim, nos meus versos, nos meus cheiros, nos meus temperos.

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Quem sabe assim, somente assim, desse jeito mesmo, deixará de ser eu, você, pra ser a gente, certa pessoa do plural.

O nada que você me deu

Enquanto todo o resto pára pra te ouvir eu olho pra vc e vejo nada. Nada.

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Não um nada qualquer, um nada doído, ressentido, que por isso mesmo deixa de ser nada e dói.

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Essa dor não é dor, é um nada acrescido. Somente chega a ser dor porque lhe falta um nome que caiba. Então fico com a dor, mesmo achando e esse nada deveria ter o teu nome. Deveria ter aqui a tua foto estampada.

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Esse nada que não é nada, essa dor que não é dor... certamente é menos do que eu precisava, e bem maior do que devia ser. Mas é, e está aqui, e me acompanha. Fui eu quem deixou doer.

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Vc me ofereceu nada e eu aceitei. Eu quiz receber. Era meu: o nada que você me deu. Fiz o que quis com ele -já que era meu- só que tudo que eu fiz foi errado, de forma que não demorou para o nada deixar de ser nulo e se tornar negativo, em conflito com qualquer positivo que ousasse existir. O positivo nunca foi alimentado, morreu agonizado numas lembranças turvas e sem registro, carentes de sentido.

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Deixei o nada tomar forma, gosto e cor. Um nada que pesa, que deixa de ser nada pra ser dor.

... e corre

Olha pro teto e pensa em tudo, em todos. Imagina o que estão fazendo, comendo, vestindo, pensando, e em o que poderia estar fazendo, comendo, vestindo, amando... começa a perceber quanto amor tem dentro, e de repente descobre que ama todo mundo, e isso não lhe cabe.

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Ama tudo ao mesmo tempo, de uma vez só, e percebe que morreria por cada ser em específico.

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Calça o sapato adequado e corre, numa rotina menor do que a do pensamento, com o cabelo preso no alto e balançando em pêndulo. Tenta gastar o excesso com desgaste da matéria permanente, da carcaça, o mais rápido que pode.

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Redescobre o mundo nessa nova perspectiva.

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Enxerga de novo o teto e sabe que isso vai mudar tanta coisa pra sempre.

Deixo pro meu bem


Escreveria mil versos agora. Poderia fazê-lo. Contudo, a mim, pareceria falso.

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A vc meu bem, desejo tudo o que palavras as não se prestam.

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Aqui elas são inúteis. Como descrever o que se sente? Como sentir num pedaço de papel?

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Deixo pro meu bem a promessa de horas de espera, tardes curtas e sussurros no ouvido.

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Deixo pro meu bem olhares incrédulos, abraços desajeitados, denguinhos e doces.

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Deixo pro meu a certeza de queixas intermináveis, essas que duram a eternidade dos poucos segundos que precedem a saudade no exato instante que ela está pra terminar. Quando meu bem abre a porta, e tudo se esvai. O resto eu nem sei mais.

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Deixo tudo pro meu bem com a esperança de que aproveite o tempo que nos e dado, enquanto ele nos basta.

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Esse meu bem.... esse bem que nem é dela, dessa mocinha tão simples, tão bege, tão boba, tão besta.

Nosso queixo

Ele tem o queixo como o meu: angular e projetado pra frente. Usa todo dia o mesmo tipo de camisa _comprou uma de cada cor num atacado qualquer. Pois é, eu percebi.

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Também notei que tem o polegar meio torto e que isso te incomoda já que costuma esfregar o indicador justamente no desvio, e que é canhoto.

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E esse nariz? Perfeito. Foi “talhado a faca” e largado na face como se todo o resto se tratasse de uma procissão de infiéis e somente ele fosse bendito. Também percebo quando me olha pelas costas.

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Tem as orelhas pequenas e não é alto. Também não é magro, tem um corpo bravamente definido apoiado em ombros austeros. Meus conceitos de harmonia todos em conflito.

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O que este homem fala, do jeito que fala e aquilo que invade o mundo nesse processo todo... Como dizer?

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Ele é esnobe e arrogante, e insiste em me olhar meio de lado vez ou outra, me alfinetar vez ou outra.

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Fico horas te observando (meu pequeno capricho desaforado). Notei um lapso temporal curioso entre nossos olhares desencontrados, e isso tudo me diverte como nada nesses últimos tempos. Me ocupo tentando desvendar o que pretende, há tantos motivos pra acreditar que quer dizer sempre o contrário do que diz de fato...

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E os olhos! Não ouso, contudo, se conseguisse descrevê-los certamente denunciaria tua identidade, e isso não pretendo (são únicos). Olhos incríveis. Nada se pode dizer por meio deles, são indecifráveis. Não confunda, não são vazios, são complexos.

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perturbam

confundem

Azuis ou verdes?

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Não pude aceitar seu duelo porque o momento do embate sempre me escapa. Por que insiste em se esconder por trás de “tudo isso”? Tenho preguiça de “tudo isso”.

Espremo

Sou alguém que não posso deixar de ser.

Desse jeito: compelida.


E eu me espremo,

porque não passo.

E eu me toco,

e não me sinto.

Então me espremo,

e não me acho.

Inquietude inicial

Ando forçando tanto as coisas ultimamente, penso que nem seria assim tão estranho se eu forçar dessa vez também...

Vou sim! Vou fazer um blog.

E ta aqui: ta feito.

[...]

Me pergunto o que fazer com ele...

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Sou uma técnica meu bem, fui criada pra ser eficiente, bem sucedida, mulher moderna e aquela coisa toda (com camisa do Che e óculos de acetato). Há muito pouco tempo eu achava que a única coisa que realmente valia a pena na vida era estudar (medíocre, eu sei), e eu fechei o olho pra tanta coisa, e isso nem serve mais pra nada, nem rima.

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Deixei de viver tanta coisa, fazer tanta coisa... e hoje me faz falta algo que eu nem sei identificar, pq tudo o que eu não sou é intuição, tudo o que eu não tenho é essa sensibilidade pra vida.

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E de uns tempos pra cá me vejo tentando espremer de mim essa angústia de qualquer forma. Esse é um tema recorrente na minha vida: me espremer. Deve haver alguma coisa que sirva.

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Então eu sento e faço isso que, definitivamente, faço tão mal: escrevo.

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Não tenho dom artístico nenhum: sou uma técnica. Até nisso eu esbarro em mim: acho que se treinar muito acabarei conseguindo. Só mais um argumento de coerção interna, e argumentos aqui não servem. Se me convencer de que sei escrever não vai muda em nada minha condição. O tanto que tenho pra dizer é inversamente proporcional à minha capacidade de fazê-lo.

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Ok, tenho uma teoria: dentre as fases que compõem o processo criativo há pelo menos algumas etapas a serem calcadas entre o conhecimento norteador de todos os conceitos que recebemos do mundo exterior e a inquietude inicial da inspiração. É exatamente nesse ponto que eu empaco. A deficiência não é de leitura, é de talento mesmo.

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Mas tem essa coisa que me persegue e que quero tanto expulsar. Então insisto em acreditar que um dia eu vou entender o que me falta e que vai fazer de mim um ser humano, e não uma força de trabalho. E eu vou seguindo, acreditando em qualquer coisa que me dêem, porque eu preciso mendigar até isso: o essencial que me falta.

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Só que o tempo passa, e o tônus da pele já não o mesmo. Não vejo mais a vida como um mar de cores e sons. Está difícil ver o sol se por, também não ouço mais a chuva caindo no telhado, não sinto mais o gosto da comida. Eu sou a metade do pouco que era, e o resto que me completa é esse vazio que insisto em preencher, com o que talvez não me convenha, que nem me rende uns bons versinhos, nada, eu sou uma técnica, e não poeta.

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Suponho que pra isso sirva esse blog, pra não me deixar esquecer quem estou deixando de ser (a menina do balanço). Um lembrete, ou talvez uma cápsula do tempo, que eu ousaria confiar a ninguém.

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Leitor (se é que vc existe), não tenho nada a ver com vc, não fecho nada contigo, não te requisito! Esse blog é meu, e só meu. Sou eu manifestada.

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Não espero nada de você blog querido, sem grandes expectativas e pretensões. Só espero que exista tempo o suficiente pra cumprir a finalidade a que te destino, minha tentativa de preencher algumas reticências, algumas aspas, e só.

 

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